21.10.08

De: Sete Contos sobre a Paixão: 4. A superintendência do amo

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-ceramente era esse o questionamento que ele mantinha na cabeça. Uma visão reducionista, bobinha... simplificação grosseira das diferenças infinitas que havia entre as duas, e que certamente não estavam ao alcance da sua abstração.

Solange tinha vocação para cachorrinha. Era obediente e prendada. Do tipo que obedece no grito, que pode ser mandada longe e depois chamada de volta como se nada tivesse acontecido, com um sorriso no rosto. Para ele toda mulher com vocação para cachorrinha não tem muita coisa de interessante nos miolos, e por isso não tem nenhuma outra vocação. Não oferece surpresas. Adora rotina, oferece uma paz infinita, com todas as mordomias dentro desse insuportável ciclo repetitivo.

Já Marina... essa era felina, aquele tipo que sempre lhe escapa dos dedos. Nada era óbvío e constante com ela exceto a certeza de que, mesmo quando abraçado a ela, ouvindo seu ronronar sereno em sua cama, ele nunca a possuiria de verdade. Ela sempre seria um desafio para sua paz. Ele teria de abrir mão da calma. Riscaria essas duas palavras do seu dicionário, assim como o verbete tédio.

Nesse momento ele observava-as como um catálogo. Não deixava-se desviar para nenhum dos lados. Elas apenas instigavam sua poderosa imaginação e, feito como refém do seu construto, podia imaginar com tamanha precisão de detalhes o tipo de vida que teria com cada uma das moças. Como seriam seus filhos, a casa, as refeições, suas amantes fora do casamento, e fundamentalmente se eles seriam felizes.
Era seu grande divertimento. Pudera, ele sempre fora melhor com probabilidades do que com a consumação dos fatos. Ele era um artista.















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